sábado, 21 de novembro de 2020

 MAIO, 4: ENQUANTO A NOITE DURAR


Em 1937 morreu, aos vinte e seis anos, Noel Rosa.


Esse músico da noite do Rio de Janeiro, que em vida só conheceu a praia por fotografias, escreveu e cantou sambas nos bares da cidade que os canta até hoje.


Num desses bares um amigo o encontrou, na noturna hora de dez da manhã.


Noel cantarola uma canção recém-parida.


Na mesa havia duas garrafas. Uma de cerveja e outra de cachaça.


O amigo sabia que a tuberculose estava matando Noel Rosa. Noel adivinhou a preocupação em seu rosto, e sentiu-se obrigado a dar uma lição sobre as propriedades nutritivas da cerveja. Apontou a garrafa, sentenciou:


- Isso aqui alimenta mais que um prato de boa comida.


O amigo, não muito convencido, apontou para a garrafa de aguardente:


- E isso aqui?


E Noel explicou:


- É que não tem a menor graça comer sem ter uma coisinha para acompanhar.


(Eduardo Galeano – Amar a mares)

Nenhum comentário:

Postar um comentário