Alexis
de Tocqueville não teria escrito A democracia na América nem Marx
escreveria O capital se se tivessem proposto tão somente a tarefa que
podiam realizar. Cabe a nós, epígonos, preencher as lacunas ou indicar erros.
No que se refere às tarefas históricas ou políticas, cada um responderá segundo
seu temperamento ou seu humor. Os franceses continuam a celebrar Napoleão, que
fez correr mais sangue que qualquer outro francês e que, no final, deixou a
França menor, mais fraca, mais próxima do declínio do que a havia encontrado. Nenhum
dos soberanos que pretendeu dar aos franceses a paz e a prosperidade encontrou
ainda um advogado entre os historiadores, embora estes tenham sido ganhos pelo
pacifismo. Tão somente os liberais, pessimistas e talvez sábios, convidam a humanidade
a propor-se tão somente tarefas que possa realizar. E é por isso que eles não
fazem a história e contentam-se habitualmente em comentá-la. Os marxistas
pertencem a uma outra família; eles medem as tarefas com o metro dos seus
sonhos e não de suas forças. Humanos, demasiadamente humanos, se, para
parafrasear uma célebre afirmação de André Gide, cada um deve preferir a si
mesmo aquilo que o devora – ou, por vezes, aquilo que devora seus semelhantes.
(Raymond
Aron – De uma sagrada família a outra)